Em 30 de abril de 2023, foi publicada a Medida Provisória nº 1.171, trazendo importantes alterações na legislação tributária que trata da tributação da renda auferida por pessoas físicas em ativos fora do país, diretamente ou através de entidades controladas e trusts no exterior, assim como altera os valores da tabela mensal do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física.

A medida provisória tem validade de 60 (sessenta) dias, prorrogáveis por mais 60 (sessenta) dias, e deve ser convertida em lei para entrar em vigor em 1º de janeiro de 2024.

Em mais uma medida destinada ao incremento da arrecadação tributária, o governo federal introduziu mecanismos que obrigam as pessoas físicas residentes no país a reconhecer os rendimentos auferidos em determinados ativos no exterior sem diferimento, alcançando, em especial (i) aplicações financeiras; (ii) entidades controladas no exterior; e (iii) bens e objetos de trust. Tal medida quebra com a posição legislativa histórica brasileira, onde, em regra, as pessoas físicas estavam sujeitas ao regime de caixa; ou seja, somente reconheciam o ganho tributável no exterior quando efetivamente disponibilizados.

De acordo com os termos da medida provisória, os rendimentos auferidos no exterior, na forma como prescreve, estarão sujeitos às alíquotas:

I – 0% (zero por cento) sobre a parcela anual dos rendimentos que não ultrapassar R$ 6.000,00 (seis mil reais);

II – 15% (quinze por cento) sobre a parcela anual dos rendimentos que exceder a R$ 6.000,00 (seis mil reais) e não ultrapassar R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais);

III – 22,5% (vinte e dois inteiros e cinco décimos por cento) sobre a parcela anual dos rendimentos que ultrapassar R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais).

I. Aplicações financeiras

Em relação aos rendimentos de investimentos financeiros detidos diretamente pelas pessoas físicas residentes, estes serão tributáveis no período de apuração em que forem efetivamente percebidos pela pessoa física, no resgate, na amortização, na alienação, no vencimento ou na liquidação das aplicações financeiras.

Dentre outros, a medida provisória listou como aplicação financeira os depósitos bancários, certificados de depósitos, cotas de fundos de investimento, com exceção daqueles tratados como entidades controladas no exterior, instrumentos financeiros, apólices de seguro, certificados de investimento ou operações de capitalização, depósitos em cartões de crédito, fundos de aposentadoria ou pensão, títulos de renda fixa e de renda variável, derivativos e participações societárias, com exceção daquelas tratadas como entidades controladas no exterior.

A medida provisória incluiu, ainda, as variações cambiais. Com a revogação do §5º do artigo 24 da Medida Provisória nº 2.158-35/01, não há mais a distinção entre investimento originariamente em reais e investimentos originariamente em moeda estrangeira. A medida provisória deverá ser regulada pelo fisco, ocasião na qual os detalhes sobre o cálculo da variação cambial serão publicados.

II. Entidades Controladas no Exterior

A medida provisória introduz medidas anti-diferimento em relação ao lucro auferido por sociedades controladas no exterior localizadas em país ou dependência com tributação favorecida ou que sejam beneficiárias de regime fiscal privilegiado ou que apurem renda ativa inferior a 80% (oitenta por cento) de sua renda total.

Em breve resumo, o conceito de controle foi estabelecido com base nos seguintes requisitos:

a. Quando a pessoa física detiver, de forma direta ou indireta, isoladamente ou em conjunto com outras partes, inclusive em função da existência de acordos de votos, direitos que lhe assegurem preponderância nas deliberações sociais ou poder de eleger ou destituir a maioria dos seus administradores; ou

b. Quando a pessoa física possuir, direta ou indiretamente, isoladamente ou em conjunto com pessoas vinculadas, mais de 50% (cinquenta por cento) de participação no capital social, ou equivalente, ou nos direitos à percepção de seus lucros, ou ao recebimento de seus ativos na hipótese de sua liquidação

O lucro auferido pela Controlada no exterior será submetido à tributação observadas as alíquotas destacadas anteriormente e deverá ser reconhecido independente de distribuição pela sociedade offshore. A medida provisória traz, ainda, a possibilidade de compensar prejuízos da sociedade no exterior com seu próprio lucro.

Os lucros auferidos até 31 de dezembro de 2023 somente serão tributáveis quando disponibilizados aos sócios residentes no Brasil.

Veja que, nos termos, da MP, as sociedades controladas deverão apurar balanço patrimonial anualmente. Não há, contudo, indicação sobre o padrão contábil a ser seguido.

III. Trusts

A nova tentativa de regulamentar a tributação de rendimentos e ativos detidos pelo trust se pauta pela transparência fiscal do instituto. Em outras palavras, os ativos detidos pelo trust deverão ser declarados e tributados pelo instituidor até que distribuídos ao beneficiário. Por exemplo, uma sociedade detida por um trust deverá ser reportada e declarada pelo instituidor seguindo o tratamento de sociedades controladas disposto na medida provisória.

De mais importante, a medida provisória trouxe a orientação de que a distribuição pelo trust ao beneficiário, a partir de 1º de janeiro de 2024, possuirá natureza jurídica de transmissão a título gratuito pelo instituidor para o beneficiário, consistindo em doação, se ocorrida durante a vida do instituidor, ou transmissão causa mortis, se decorrente do falecimento do instituidor.

IV. Atualização do custo fiscal de ativos mantidos no exterior

A medida provisória oferece alternativa ao contribuinte que desejar atualizar o custo histórico de seus ativos no exterior para o valor de mercado de 31 de dezembro de 2022, pagando 10% sobre a mais-valia, devendo o imposto ser pago até 30.11.2023. Dentre os ativos passíveis de atualização, estão as aplicações financeiras, bens imóveis, aeronaves, embarcações, veículos, participações em sociedades controladas (excepcionalmente poderão utilizar o balanço de 12/2023).

V. Outras disposições

Além de atualizar as faixas do imposto de renda de pessoa física, medida provisória também revogou importantes dispositivos sobre a tributação das pessoas físicas, dentre eles o dispositivo que excluía da tributação no Brasil o ganho de capital relativo à venda de bem ou direito localizado no exterior.

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