O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (“CADE”) realizou no último dia 13.11.2018 audiência pública para discutir temas relacionados à verticalização do setor financeiro e potenciais impactos positivos e negativos sobre a concorrência.
O evento, intitulado “Estrutura do setor financeiro nacional: impacto da verticalização sobre a concorrência”, reuniu incumbentes do setor bancário e financeiro tradicional, representantes do governo, entidades representativas de diversos setores da indústria, comércio e serviços, além de representantes da sociedade civil, da academia e de fintechs.
Trata-se de mais uma das diversas iniciativas que têm sido tomadas pela autarquia em parceria com o Banco Central do Brasil (“BACEN”), visando a fomentar a competitividade do setor e conferir maior segurança jurídica no assunto aos diversos stakeholders do sistema financeiro nacional.
Os temas debatidos dividiram-se em quatro painéis: (i) “A verticalização na teoria e na prática: eficiências e potenciais riscos à concorrência”; (ii) “Efeitos da verticalização sobre a indústria de pagamentos eletrônicos”; (iii) “Juros e spread bancário: qual o impacto da verticalização sobre a competitividade?”; e (iv) “Fintechs: a oferta de serviços pelas novas empresas de tecnologia financeira e a concorrência com o setor financeiro tradicional”.
De maneira geral, os debates reforçaram o entendimento comum de que a verticalização no setor financeiro não é necessariamente prejudicial à concorrência, havendo diversos casos em que eficiências são geradas a partir da verticalização (e.g. redução dos custos de transação, capilarização dos serviços financeiros, inclusão de novos usuários, etc). Diversos expositores realizaram comparações com os índices de verticalização e concentração do setor bancário e financeiro nacional com aqueles observados em outros países (notadamente, EUA, países da União Europeia e da América Latina) e em outros setores da indústria no Brasil e no mundo (e.g., ferrovias e outros setores regulados com compartilhamento de infraestrutura comum ou essential facilites), buscando demonstrar que a estrutura do sistema financeiro nacional não é única no mundo. Da parte dos incumbentes tradicionais do setor bancário, o entendimento é de que cabe ao CADE manter o controle que já é feito através da investigação caso a caso de condutas verticais anticompetitivas e, ao BACEN, exercitar sua competência de regulação e fiscalização do setor.
Representantes e associações de fintechs, criptomoedas e blockchain defenderam que medidas comportamentais a posteriori pelo CADE e pelo BACEN são insuficientes para garantir a competição efetiva no setor, além de representarem altos custos de regulação e fiscalização para a administração pública. Para alguns dos debatedores, a origem dos problemas – e a sua solução – residiria na garantia de entrada através da redução de barreiras, sejam elas regulatórias (i.e., impostas por entes administrativos como o BACEN ou o CADE), estruturais (aquelas decorrentes da própria estrutura dos mercados envolvidos) ou artificiais (i.e., impostas artificialmente por concorrentes).
Embora a audiência pública não tenha por objetivo direto vincular a atuação do CADE ou do BACEN, trata-se de iniciativa que integra ampla agenda organizada pelas autoridades nacionais voltada ao fomento à concorrência e a incentivos para avanços estratégicos no setor[1] e ao aperfeiçoamento institucional de ambos os órgãos.
A respeito desta última questão, CADE e BACEN têm trabalhado conjuntamente para aumentar o nível de cooperação institucional entre ambos os órgãos. Em 28.2.2018, CADE e BACEN celebraram Memorando de Entendimentos relativo aos procedimentos de cooperação na análise de atos de concentração econômica no sistema financeiro nacional. Durante o período de 17.10.2018 a 27.10.2018, permaneceu sob consulta pública minuta de texto do Ato Normativo Conjunto CADE/BACEN nº 1, que dispõe sobre procedimentos em atos de concentração de instituições financeiras e em controle de condutas de instituições sujeitas à supervisão ou vigilância BACEN nas infrações à ordem econômica.
Espera-se que as diversas visões apresentadas na audiência pública sejam refletidas pelo CADE e pelo BACEN nas tomadas de decisões e exercício de suas funções normativas e de regulação nos próximos anos.
As discussões da audiência pública podem ser acompanhadas em sua íntegra (disponível em www.youtube.com/watch?v=bq-9vVKOQAg) e cópias das apresentações encontram-se disponíveis em www.cade.gov.br/acesso-a-informacao/participacao-social-1/audiencias-publicas-concluidas/.
Para mais informações, entrar em contato com:
Fabricio A. Cardim de Almeida
Fabricio.Cardim@mellotorres.com.br.br
+55 (11) 3074-5709
Maurício Antunes Domingos
Mauricio.Domingos@mellotorres.com.br.br
+55 (11) 3074-5735
[1] A título exemplificativo, o BACEN tem desenvolvido o BC+, uma agenda de trabalho que tem como objetivo revisar questões estruturais do BC e do Sistema Financeiro Nacional (“SFN”), a fim de gerar benefícios sustentáveis para a sociedade brasileira. O programa é estruturado em quatro pilares temáticos: (i) inclusão financeira (“Mais Cidadania Financeira”); (ii) “Legislação Mais Moderna”; (iii) simplificar os procedimentos e regras do BACEN (“SFN Mais Eficiente”); e (iv) “Crédito mais Barato”. Maiores informações sobre o BC+, inclusive ações e iniciativas voltadas ao fomento da concorrência no setor financeiro, podem ser acessadas em www.bcb.gov.br/pt-br/#!/c/BCMAIS/.