Alterações na Lei de Improbidade Administrativa

Em 26 de outubro de 2021, foi publicada a Lei Federal nº 14.230 que modifica a Lei de Improbidade Administrativa (Lei Federal nº 8.429/1992), destinada à defesa da probidade, honestidade e moralidade administrativas.

Ao longo dos seus 29 anos de vigência, a Lei de Improbidade foi alvo de diversas críticas e, sobretudo, por não ser clara acerca dos requisitos para aplicação das severas penas que prevê.

Eis, assim, que a Lei Federal nº 14.230 endereçou parâmetros mais claros para a aplicação da Lei de Improbidade, bem como promoveu modificações mais aderentes à jurisprudência e aos posicionamentos doutrinárias. Abaixo mencionamos as principais alterações realizadas.

 

Natureza e tipicidade dos atos de improbidade administrativa

Primeiramente, atos de improbidade administrativa são aqueles que “violam a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções e a integridade do patrimônio público e social dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, bem como da administração direta e indireta, no âmbito da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal” (art. 1º, § 5º).

Em termos mais concretos, a improbidade consiste na prática de atos que (i) ensejam o enriquecimento ilícito do agente (artigo 9º); (ii) causam dano ao erário (artigo 10); e (iii) atentam contra os princípios da administração pública (artigo 11).

Conforme a Lei Federal nº 14.230, a caracterização da improbidade só ocorre se algum dos atos acima mencionados foi querido pelo agente, ou seja, é preciso que haja conduta dolosa, entendida como “a vontade livre e consciente do agente em alcançar o resultado ilícito tipificado nos artigos 9º, 10 e 11 da lei” (art. 1, §2 º).

Com isso, parece induvidoso que condutas meramente culposas, isto é, por negligência, imprudência ou imperícia, não mais possam caracterizar improbidade administrativa.

Além disso, a Lei Federal nº 14.230 determina que apenas o rol de atos nela previstos podem ser qualificados como improbidade. Com isso, supera-se o entendimento jurisprudencial consistente de que as condutas definidas na lei eram um rol exemplificativo.

 

Legitimidade passiva

A redação anterior definia que eram passíveis de condenação por improbidade (i) os agentes públicos que praticassem ou concorressem para a prática do ato típico; bem como (ii) os agentes privados que induzissem ou concorressem para a prática do ato de improbidade ou que dele se beneficiassem sob qualquer forma direta ou indireta.

Com a Lei Federal nº 14.230, suprimiu-se a possibilidade de se condenar o agente privado que, mesmo não participando do ato improbo, se beneficie dele. Isso porque, agora, são passíveis de condenação por improbidade (i) os agentes públicos que pratiquem ou concorram com a prática do ato e (ii) os agentes privados que induzam ou concorram dolosamente para a prática do ato de improbidade.

 

Legitimidade ativa

Anteriormente, eram legítimos para propor a ação civil por improbidade administrativa: (i) o Ministério Público e (ii) o ente da administração pública diretamente lesado pela prática do ato de improbidade administrativa.

Com a alteração da lei, o Ministério Público passou a ser o único legítimo para propor a ação. Entretanto, as alterações promovidas não atingem a prerrogativa do ente lesado para liquidar e executar a condenação relativa ao ressarcimento do dano patrimonial e reversão de bens e valores em seu favor.

Dessa forma, o ente lesado continua legítimo para perseguir o pagamento dos valores de ressarcimento, desde que o faça em um prazo de seis meses do trânsito em julgado da condenação. Superado o prazo, fica legitimado o Ministério Público para executar, além das sanções impostas, também o ressarcimento do dano.

 

Procedimento

No que se refere ao procedimento da ação civil por improbidade administrativa, foi suprimida a fase pré-processual que possibilitava a apresentação de defesa prévia ao recebimento da inicial pelo juiz.

A nova redação é explicita ao definir que a ação seguirá as regras do procedimento comum estabelecidas no Código de Processo Civil de 2015, com algumas peculiaridades:

  • O prazo para contestação será de 30 dias, contados na forma estabelecida no Código de Processo Civil;
  • Não haverá presunção de veracidade dos fatos narrados na inicial, ante à revelia do requerido;
  • Não poderá haver a inversão do ônus da prova; e
  • Não será aplicável o instituto do reexame necessário nos casos de improcedência ou extinção da ação.

 

Ainda, quanto à decretação da indisponibilidade de bens dos requeridos, faz-se necessária (i) a comprovação de fundado perigo de dano irreparável ou de risco ao resultado útil do processo para utilização deste mecanismo legal e (ii) em regra, a prévia oitiva do requerido (art. 16, §3º). Com isso, a nova redação altera o entendimento anterior de que a decretação da indisponibilidade não dependia da comprovação de receio de dano e da oitiva do requerido.

 

Prescrição

Segundo a redação original, a ação prescreveria:

  • Em 5 (cinco) anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de confiança, contados a partir do último mandato exercido (entendimento jurisprudencial);
  • Dentro do prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público, nos casos de exercício de cargo efetivo ou emprego;
  • Em 5 (cinco) anos da data da apresentação à administração pública da prestação de contas final.

 

A lei era silente quanto ao prazo prescricional das ações que envolviam não só agentes públicos, como também agentes privados, de forma que a jurisprudência aplicava aos agentes privados o mesmo prazo prescricional dos agentes públicos em exercício de mandato, em cargo em comissão ou de função de confiança.

Com a alteração promulgada, o prazo prescricional passou a ser único: 8 (oito) anos, contados a partir da ocorrência do fato ou, no caso de infrações permanentes, do dia em que cessou a permanência (art. 23).

Ainda, a nova redação previu a prescrição intercorrente, com a qual, interrompida a prescrição, o prazo prescricional recomeça a correr do dia da interrupção, pela metade do prazo inicial (art. 23, §5º).

 

Sanções

Quanto à aplicação de penalidades, houve alteração substancial nas sanções:

  • Atos que importem em enriquecimento ilícito (artigo 9º)
    • Aumentou-se o prazo de suspensão dos direitos políticos de 8 a 10 anos para até 14 anos;
    • Reduziu-se da multa civil aplicável, que antes era de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial e passou a ser equivalente ao valor do acréscimo patrimonial; e
    • Quanto à sanção de proibição de contratar com a administração pública e receber benefícios, a pena passou de 10 anos para até 14 anos.

 

  • Atos que importem em dano ao erário (artigo 10)
    • Aumentou-se o prazo de suspensão dos direitos políticos de 5 a 8 anos para até 12 anos;
    • Reduziu-se a multa civil aplicável, que antes era de até duas vezes o valor do acréscimo patrimonial e passou a ser equivalente ao valor do acréscimo patrimonial; e
    • Quanto à sanção de proibição de contratar com a administração pública e receber benefícios, a pena passou de 5 anos para até 12 anos.

 

  • Atos que atentem contra os princípios da administração pública (artigo 11)
    • Suprimiu-se as penas de perda da função pública e de suspensão dos direitos políticos;
    • Reduziu-se da multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente para até 24 vezes o valor da remuneração percebida pelo agente; e
    • Quanto à sanção de proibição de contratar com a administração pública e receber benefícios, a pena passou de 3 anos para até 4 anos.

 

Conclusão

As alterações implementadas adequam-se ao movimento de fortalecimento da segurança jurídica ao darem parâmetros mais claros sobre a configuração do ato de improbidade.

 

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